coluna raul lody

As castas de pimentas na Bahia

25 de mar de 2015

Sem dúvida, as pimentas nativas do gênero Capsicum fazem parte de uma grande base formadora dos hábitos alimentares da Bahia; reminiscências das tradições dos povos nativos, os nossos indígenas.
Dos manuscritos do “Roteiro Geral”, que traz largas informações de toda a costa do Brasil, e sobre a sua fertilidade, das mais notáveis, foram publicados apenas no século XIX, com o título de “Tratado Descritivo do Brasil em 1587”, cuja autoria foi atribuída a Gabriel Sores de Sousa. Vê-se aí um importante memorial sobre a colônia de Portugal no Brasil e, em especial, na Bahia.
Desta obra, trago um relato sobre as nossas pimentas americanas; pimentas frescas, vermelhas, verdes; coloridas; pimentas da Bahia.

“(...) destes legumes e, na sua vizinhança, podemos ajuntar quantas castas de pimentas há na Bahia, segundo nossa notícia; e digamos logo da que chamam de cuihem, que são tamanhas como cerejas, a quais se comem em verde, e, depois de maduras, cozidas inteiras com o pescado e com os legumes, e de uma maneira e de outra queimam muito, e o gentio come-a inteira, misturada com a farinha.
Costumam os portugueses, imitando o costume dos índios, secarem esta pimenta, e depois de estar bem seca, a pisam de mistura com sal, ao que chamam de juquitai, em a qual molham o peixe e a carne, e entre os brancos se traz no saleiro, (...).
 Há uma outra pimenta, a que pela língua dos negros se chama cuiemuçu; esta é grande e comprida, e depois de madura faz-se vermelha; e usam dela como da de cima (...).”
(Tratado do Brasil em 1587. Organização Fernanda Trindade Luciani. Gabriel Soares de Souza. São Paulo: Hedra, 2010. Pag. 177-178)

As diferentes pimentas que estão integradas nas tradições dos preparos das comidas dos povos nativos chegam à mesa do europeu, que há muito já tinham ampliado seus sabores com as especiarias do Oriente e da costa da África.   Assim, destaque para a pimenta “grão-do-paraíso”; e a pimenta-preta, a nossa tão conhecida pimenta-do-reino.  Entre outras especiarias usadas, haviam: canela, cravo, gengibre.  Todas estas também integradas às receitas da Bahia, e misturadas aos seus sabores, e com isso se unem ao dendê.

Nas pimentas estão as marcas da identidade do estilo baiano; dos modos de comer e de representar à mesa um sentido daquilo que é quente com o uso da pimenta, e dos molhos apimentados. A Bahia traz um desejo cultural pelas pimentas na construção do seu conceito do bem comer.

Raul Lody
23 de Março de 2015.