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Ado: as receitas africanas de Manuel Querino nº5

20 de jun de 2016

As receitas relatadas por Querino têm uma forte presença do milho, um ingrediente americano que é interpretado e reinventado no olhar e nas técnicas culinárias de matriz africana na Bahia.

Certamente na mesa da Bahia, o milho nas suas variadas formas, cores e sabores, africanizou-se e se uniu ao dendê, que é africano; ao leite de coco, que provavelmente veio da Índia, e com especiarias também do Oriente.

Assim, o milho revela o retrato de um sistema alimentar multicultural cotidiano, que e preservado nas festas, nas tradições religiosas, nas casas e, em especial, nos cardápios feitos à base de milho para as festas de São João, e nos muitos pratos dedicados aos orixás do candomblé na cidade do São Salvador.

São muitas as comidas de milho que integram os cardápios afrodescendentes da Bahia: acaçá branco, acaçá vermelho, aberém; cuscuz, angu, ebô; mungunzá, axoxó, doboru; e bebidas como aluá, dengue, afurá, entre outras.

E, sobre o “ado”, diz Querino: “Ao milho torrado e ralado na pedra, depois de passado na peneira, adicionava o africano um pouco de açúcar e a isso chamavam fubá de milho (...)”. Ainda, informa Querino sobre o ado, que aquela farinha de milho (milho do tipo alho) era torrada e temperada com “azeite de cheiro” e mel de abelhas. (A arte culinária da Bahia. WMF Martins Fontes, 2011. Org. e notas: Raul Lody).

Hoje essa comida faz parte do cardápio do terreiro de candomblé, e uma comida ritual dedicada para os deuses e para os homens, pois assim o sagrado é experimentado no sabor que traz memórias africanas. A comida partilhada reforça os elos do sagrado entre o orixá e o homem.

 

Raul Lody, 20 de junho de 2016