COLUNA RAUL LODY
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Os sabores patrimoniais de Saubara.

Saubara é famosa pelas suas marisqueiras e da variedade de pratos que são organizados a partir dos saborosos moluscos que ganham interpretações gastronômicas com o emprego do leite-de-coco e do azeite-de-dendê.

No Recôncavo está uma tradicional cozinha afrodescendente à base do dendê. Moquecas, feijões, legumes, folhas, todos refogados e banhados no epô o nosso dendê, como chamam os Iorubás.

Trazido da Costa d’África, espalhou-se pela costa da América, da Bahia para o Norte, dando com exuberância seus fartos cachos negros-caboclos que chegam a um metro de comprimento, a trinta quilos de peso, a oitocentos cocos às vezes.
Em 1759, na Bahia, Antonio Caldas informava que o comércio freqüente do dendê, entre a Costa da Mina e o Brasil, era intenso, provando a falta de dendezeiros que atendessem às necessidades do consumo.Vilhena afirma que, no ano de 1798, entraram na Bahia mil canadas de azeite-de-dendê, oriundas da Costa da Mina e quinhentas canadas da Ilha de São Tomé, perfazendo aproximadamente quatro mil litros.
A grande área de produção do dendê da costa africana estende-se de Angola até a Gâmbia (...).1

Sem dúvida, o dendê e seus muitos usos na gastronomia é atestação histórica e econômica de povos e culturas africanas no Brasil, especialmente na Bahia, no Recôncavo.

O dendê está presente nas casas, nos terreiros de candomblé, nos tabuleiros das baianas de acarajé, nas festas; marcando a vida, o costume e integrando o paladar do baiano e daqueles que experimentam e incluem os pratos de azeite nos seus hábitos.

A mesa de Saubara é rica e variada de pratos, de sabores e de opções, iniciando-se com o acaçá de arroz. Feito de creme de arroz, leite-de-coco e açúcar. É fazer um mingau bem grossinho e colocar em tipo de embalagem feita de folha de bananeira passada ao fogo.

As moquecas fazem o destaque dos cardápios da cidade. São moquecas de ostra, moqueca de bebe fumo, moqueca de preguarí, moqueca de sacaraúna, moqueca de siri catado, moqueca de aratu, moqueca de caranondé, moqueca de arraia, moqueca de tainha, moqueca de sardinha, moqueca de miroró, moqueca de atapu, moqueca de sororoca, moqueca de vermelho, moqueca de robalo. Há também a mesma série de pratos enquanto ensopado. A diferença está no ingrediente básico. Moqueca é feita com azeite-de-dendê e ensopado é feito com leite-de-coco.

Há ainda pirão de siri, salada de marisco, salada de ostra, salada de siri catado. Além dos tão consagrados caruru, vatapá, efó feito de língua de vaca, feijoada.

Os doces são também grandes realizações da cozinha de Saubara. Doces de carambola, banana, jenipapo, caju; bolo de massa, carimã, canjica de milho verde, mungunzá; também os licores artesanais de jenipapo, caju, gengibre, tamarindo, beterraba, coco complementam as ofertas do que comer e do que beber.

1 CARNEIRO, Edison. Ladinos e crioulos. Rio de Janeiro: Vozes, 1976.

Raul Lody

O AUTOR Antropólogo, especialista em antropologia da alimentação, museólogo. Representou o Brasil no International Commission the Anthropology of Food. Autor de vasta obra publicada com centenas de artigos, filmes, vídeos, e mais de 70 livros nas áreas de arte popular e gastronomia/cultura/ patrimônio. Reconhecido por premiações mundiais e nacionais pelo Gourmand World Cookbook Awards. Curador da Fundação Gilberto Freyre, da Fundação Pierre Verger e do Museu da Gastronomia Baiana do Senac Bahia.