COLUNA RAUL LODY
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A agricultura e o ritual do milho

“Meu Divino São José

imploro em vossos pés

mandar chuvas em abundância

meu Jesus de Nazaré”.

 

                                                                                              ( poesia popular)

 

São muitas, e diversas, as relações ancestrais entre o homem e a agricultura que trazem ligações com as mitologias, a religiosidade, e tantas outras maneiras de manifestar ancestralidade aliada às técnicas do plantio e da colheita.

Sem dúvida, a sabedoria tradicional nos campos, especialmente no trato com as sementes, mostra que há grandes e ricos repertórios relacionados ao conhecimento das culturas alimentares, que se manifestam conforme as características dos ecossistemas e os hábitos culturais das populações envolvidas com os diferentes processos de lidar com a terra.

Nestes amplos contextos ecológicos, sociais e culturais, destaca-se uma semente, tanto pela sua importância quanto pelo seu significado para a alimentação de milhares de pessoas. Refiro-me ao milho, que é o cereal mais consumido no mundo.

Na agricultura brasileira, há várias maneiras populares e memoriais de lidar com o milho, um ingrediente tão marcante na formação do nosso patrimônio alimentar, e base para amplos e diversos cardápios do cotidiano e das das festas, especialmente as festas dedicadas aos santos populares de junho Antônio, João e Pedro.

No Nordeste há uma forte tradição, apoiada na devoção e na religiosidade, que diz que se deve semear o milho, plantar o milho, no dia de São José, 19 de março, para então colher em junho, próximo as datas dos santos populares de junho, visto que o milho é colhido em torno de 90 dias após o seu plantio.

Assim, o consumo deste cereal nas festas, nas muitas festas celebradas nas mesas brasileiras com pamonha, canjica, mugunzá, bolos, biscoitos, acaçás, entre tantas outras comidas, é também a manifestação de ritos ancestrais que preservam importantes  patrimônios alimentares.

 

Raul Lody

O AUTOR Antropólogo, especialista em antropologia da alimentação, museólogo. Representou o Brasil no International Commission the Anthropology of Food. Autor de vasta obra publicada com centenas de artigos, filmes, vídeos, e mais de 70 livros nas áreas de arte popular e gastronomia/cultura/ patrimônio. Reconhecido por premiações mundiais e nacionais pelo Gourmand World Cookbook Awards. Curador da Fundação Gilberto Freyre, da Fundação Pierre Verger e do Museu da Gastronomia Baiana do Senac Bahia.