coluna raul lody

O mito da criação da feijoada

01 de nov de 2017

O princípio do aproveitamento dos ingredientes está em todos os povos, evidentemente com respeito às características culturais e religiosas na hora de selecionar os alimentos. Por exemplo, muçulmanos e judeus não comem carne de porco. Já os cristãos são verdadeiramente onívoros. E este entendimento de que aproveitar tudo é preciso também faz parte dos hábitos do brasileiro. Feijão branco com tripas de porco; feijão preto com carne salgada de boi, carne de porco de fumeiro; e, em especial, o feijão na forma de feijoada, que passou a ser conhecida no nosso imaginário como uma “comida de senzala”.

Ainda, há aquela mitologia de que os senhores de engenhos, por não comerem as partes menos nobres dos animais, como as vísceras e cartilagens, mandavam-nas para que fossem preparadas para as comidas dos africanos em condição escrava. Nessa fantasia, na mesa dos “brancos” iam as partes nobres das carnes, e para as senzalas iam as vísceras, as orelhas, os pés, o rabo, entre outras partes. Aliada a essa história, há a “cozinha da senzala” aonde as africanas com lindos turbantes, panos da costa, cantavam enquanto cozinhavam; e ouviam os sons dos “batuques”, da capoeira, da “umbigada”, faz parte da idealização dessa mitologia, que não condiz com a verdade histórica sobre a crueldade que sofriam homens e mulheres em condição escrava no Brasil colônia.

Além disso, a cozinha ibérica é marcada pelos embutidos, enchidos, feitos com a gordura e o sangue de animais; além do o uso do sangue no estilo à cabidela, para aves, coelhos, lebres; também, para o sarrabulho; ainda, há as tripas à moda do Porto; e tantas e tantas outras receitas que foram abrasileiradas. Contudo, a nossa popular feijoada está marcada nas tradições alimentares da Bahia, certamente por causa da mão africana na cozinha que foi tão fundante nos hábitos alimentares de todos nós brasileiros.

Raul Lody