COLUNA RAUL LODY
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A feijoada de Ogum na tradição afro-baiana

Sem dúvida, o feijão é um dos ingredientes mais populares, sendo uma base alimentar fundamental para milhões de brasileiros, juntamente com o arroz e a farinha de mandioca. E, com eles, vive-se o clássico arroz com feijão e farinha, um verdadeiro símbolo nacional.

Também, o feijão com a farinha de mandioca forma uma base saborosa que se apresenta como uma das possibilidades alimentares mais recorrentes, pois o brasileiro é um comedor de feijão.

Desta maneira, o brasileiro afirma sua identidade alimentar nesta leguminosa que é consumida nas suas variedades de tipos e sabores, e nos seus diversos usos culinários.

Esta leguminosa é o principal ingrediente do acarajé, do abará, do feijão de azeite; e, em especial, da feijoada, uma comida que está no cotidiano e na celebração. A sua receita une o feijão com carnes frescas ou “verdes” de boi, carnes salgadas e defumadas de porco, embutidos, e muitos temperos; e, mais uma vez, seu acompanhamento preferencial é o arroz e a farinha de mandioca.

E a feijoada das casas vai para os terreiros de candomblé, e se torna uma tradição afro-baiana que, segundo as histórias orais, nasce do hábito do oferecimento da feijoada de feijão preto enquanto uma comida consagrada ao orixá Ogum. E, este orixá é relacionado, no sincretismo, com santo Antônio, um dos santos católicos mais populares.

Ainda, em Salvador, atribui-se a tradição do oferecimento da feijoada para Ogum ao babalorixá Procópio do Ogunjá. E o motivo é que numa visita de um filho de santo ao terreiro, Procópio não lhe oferece comida, e isto é um grave acontecimento, porque oferecer comida nos terreiros aos visitantes é um ato religioso fundamental.

Então, Ogum “pega” Procópio e diz: você dará uma feijoada completa, e oferecerá todos os anos aos seus filhos de santo e visitantes. E assim, começa a tradição do “feijão de Procópio” ou da “feijoada de Ogum”, uma nova comida consagrada no candomblé da Bahia.


 

Raul Lody

O AUTOR Antropólogo, especialista em antropologia da alimentação, museólogo. Representou o Brasil no International Commission the Anthropology of Food. Autor de vasta obra publicada com centenas de artigos, filmes, vídeos, e mais de 70 livros nas áreas de arte popular e gastronomia/cultura/ patrimônio. Reconhecido por premiações mundiais e nacionais pelo Gourmand World Cookbook Awards. Curador da Fundação Gilberto Freyre, da Fundação Pierre Verger e do Museu da Gastronomia Baiana do Senac Bahia.