COLUNA RAUL LODY
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Uma farinha de banana. As receitas africanas de Manuel Querino nº6.

O uso culinário da banana no Recôncavo da Bahia é muito variado. A banana está presente desde o doce de banana de rodela ou de “rodelinha”, que é preparado com cravo, canela, e muito açúcar; até ao hábito de comê-la in natura. E há muitos diferentes tipos de bananas: ouro, prata, maçã, pacová, entre tantas outras.

Outra presença está na receita da banana frita no azeite de dendê, e polvilhada de açúcar e canela. Assim, integram-se aos cardápios do café da manhã, ou no Caruru de Cosme, celebração votiva realizada durante o mês de setembro.

Na obra de Querino há uma receita feita com um tipo de banana conhecida como banana São Tomé, o que já indica procedência africana, certamente das ilhas de São Tomé e Príncipe, África ocidental, para fazer uma comida chamada de “efum-oguedê”. Querino relata: “Prepara-se com a banana de São Tomé, não amadurecida de todo, descascada, cortada em fatias e deitada ao sol para secar. Dias depois pisa-se no pilão, passa-se na peneira e obtém-se a farinha chamada efum-oguedê. (A Arte Culinária da Bahia. WMF Martins fontes, 2011. Org. e notas de Raul Lody). Nesta receita estão alguns processos culinários artesanais comuns nas cozinhas tradicionais como uso do pilão de pedra ou do pilão de madeira, e das peneiras feitas de fibras vegetais.

É importante destacar que diferentes farinhas formam a base culinária de muitas receitas de matriz africana. Farinhas de milho para se fazer angus e acaçás; farinhas de mandioca para se fazer pirões, inclusive com dendê; e farinha de castanha de caju e de amendoim para temperar vatapá. Desta maneira, a farinha marca um estilo de se fazer “comidas moles”, que são marcantes nos cardápios afrodescendentes. Assim, a farinha de banana é, com certeza, uma base para se fazer algum tipo de mingau doce ou de pirão para acompanhar carnes ou comidas temperadas com pimentas e dendê, como ocorre com as bolas de inhame ou mesmo o acaçá branco.

O AUTOR Antropólogo, especialista em antropologia da alimentação, museólogo. Representou o Brasil no International Commission the Anthropology of Food. Autor de vasta obra publicada com centenas de artigos, filmes, vídeos, e mais de 70 livros nas áreas de arte popular e gastronomia/cultura/ patrimônio. Reconhecido por premiações mundiais e nacionais pelo Gourmand World Cookbook Awards. Curador da Fundação Gilberto Freyre, da Fundação Pierre Verger e do Museu da Gastronomia Baiana do Senac Bahia.